(...) Lembro-me com nitidez do dia em que entrei no salão O Nome da Rosa para entrevistar Maria Emília Lemos. Cumpria nessa data dois anos ao serviço do Regional. Como qualquer solitário sou dado à melancolia dos balanços. Pensando naquele período não pude deixar de sorrir da minha capacidade de adaptação. As borgas com os comissionistas, eivadas de irresponsabilidade adolescente, eram uma excelente estratégia escapista. Sentia-me um romântico em trânsito pela terra dos cínicos.
Tenho simpatia política por aqueles que defendem a luta de classes como o motor da História. No entanto, inclino-me para atribuir esse papel tractor e precursor ao acaso. Se fundasse uma teoria geral da evolução do mundo, quer fosse uma ideologia quer fosse uma religião, dando-se o caso de uma e outra coisa não serem o mesmo, talvez chamasse acasismo a essa minha tese definitiva (...).
quarta-feira, 27 de março de 2013
segunda-feira, 18 de março de 2013
Notícia n'A Voz de Ermesinde
A Voz de Ermesinde noticiou o lançamento de Um Romântico em Trânsito pela Terra dos Cínicos. Ler aqui.
sexta-feira, 15 de março de 2013
Hipocondríaco em acção - Excerto do capítulo 10
(...) eram 4h23, segundo o relógio despertador
pousado na mesinha-de-cabeceira, acordei de rompante. Ao contrário de outras
noites, não estava agitado nem transpirado. Mas uma sensação estranha
consumia-me. Era como se um novelo de lã me tivesse entrado na boca enquanto
dormia e agora quisesse bloquear-me a respiração. Estava a tomar um medicamento
que, segundo a respectiva bula, poderia causar um choque anafilático,
Rapidamente juntei dois mais dois e, num ápice, coloquei-me em frente ao
espelho do quarto-de-banho, goelas abertas até trás e olhos postos na úvula.
Estava gigantesca. O coração disparou, comecei a caminhar de um lado para o
outro, sem saber se deveria telefonar para o 112 ou não. Entretanto, sentia o
corpo estranho a crescer no orifício oral. A taquicardia acelerava. Perdi a
vergonha de passar por hipocondríaco histérico e telefonei para o número de
emergência. O operador perguntou-me os sintomas, a designação dos medicamentos
que tomava habitualmente e pediu-me alguns instantes para consultar o médico de
serviço. Daí a instantes estava de novo em linha:
- Mantenha-se calmo e vá verificando se
continua a respirar sem problemas, apesar do mal-estar, enquanto mandamos para
aí uma ambulância.
- Ambulância? Mas é mesmo grave?
- Tanto pode ser como não ser. À Cautela
enviamos a ambulância. A menos que prefira ir monitorizando a situação. Se
sentir problemas para respirar pode voltar a telefonar-nos. Ou prefere a
aconselhar-se com a linha Saúde para
Todos?
- Se calhar é melhor. Falo com eles e logo
vejo.
O operador passou a chamada telefónica.
Atendeu-me um tipo enfadado, que deveria estar a ser acordado naquela altura.
Ouvia mal o que eu lhe dizia e penso que não acreditava que eu estivesse
doente. Tomava-me por um lunático solitário sem nada para fazer durante a
madrugada. A desconfiança parecia-me estar a demover o indivíduo de atender-me
convenientemente. Mas ao fim de longos segundos, que pareceram muitos minutos,
ele iniciou uma tentativa de diagnóstico.
- Mas só tem a glote inchada?
(Eis o motivo da desconfiança do meu
interlocutor. Queria referir-me à úvula, mas, enervado e com medo de sufocar,
disse-lhe que tinha a glote inchada, o que fazia pouco sentido)
- Acho que sim.
- Acha que sim? Mas e a cara, a cara não está
inchada?
Fui até junto do espelho, olhei-me de frente
e de perfil, de um lado e do outro e gritei:
- Sim, a cara também está inchada. Isto é
grave?
- Mas está inchada como?
- Inchada como? Inchada!
- Mas está o dobro do que é costume?
- Isso também não, está um pouco mais larga.
- E manchas no corpo, tem?
Passei-me revista em três tempos. Nada de
manchas.
- Não, a pele está normal.
- Experimente chegar com o queixo ao peito,
consegue?
- Sim.
Respondeu-me algo que não consegui perceber,
porque ouvia uma outra operadora berrar por trás dele:
- A senhora não urina há três semanas???!!
Pedi-lhe que repetisse e o que ele dissera
fora:
- Vai fazer o seguinte: ingere líquidos
frescos para ver se lhe passa o tal desconforto na garganta que lhe parece um
inchaço. Vai-se deitar, coloca a almofada alta para reduzir o risco de asfixia,
e tenta descansar o resto da noite.
- Está bem, obrigado.
Passou-me um atestado de histeria. Mas ele
tinha razão. Nada em mim intumescera. Foi tão só um ataque de pânico que me ia
custando a reputação, se tivesse deixado partir a ambulância em meu socorro (...)
quinta-feira, 14 de março de 2013
Um pouco do capítulo 8
(...) A jovem despretensiosa que conheci na faculdade envelhecera depressa. Vestia-se de modo excessivamente formal, derramava perfume por todos os poros e, como jamais a vira, empoleirava-se nuns saltos altos para os quais, notoriamente, carecia de treino. A conversa foi enfadonha. Revelou-me que se casara com o homem com quem namorava desde os 15 anos e confidenciou-me planos para engravidar celeremente. Por pudor não lhe disse que sempre que fumava um cigarro ao acordar não me limitava a inalar fumo. Brindava aos anúncios que, nos maços de tabaco, avisam que fumar faz reduzir os espermatozóides e pode diminuir a fertilidade.
O momento mais palpitante do encontro foi quando me informou que a revista para a qual trabalha tem interesse em colaboradores externos e que o meu texto sobre Madrid despertara a curiosidade das chefias, que estavam dispostas a comprar-me serviços. Para ser sincero, nem fazia ideia se o meu contrato com o Periódico permitia esse tipo de relação profissional. Mas garanti-lhe que tal me estava vedado por um rigoroso acordo de exclusividade. Pedi-lhe, todavia, que tentasse manter a porta entreaberta para o futuro, assegurei-lhe, mesmo sendo falso, que a ideia de escrever para uma revista de viagens me seduzia. Despedimo-nos com promessas de ficarmos em contacto e, hipocritamente, desejei-lhe sucesso na tarefa de procriar. Anos antes, sentir-me-ia atraído pela ideia de exercitá-la para a concepção, mas, defronte do aburguesamento precoce daquela figura, em tempos bela, porque arisca e simpaticamente selvagem, os sentimentos eram outros. Não seriam de repulsa, mas de desilusão eram certamente (...).
O momento mais palpitante do encontro foi quando me informou que a revista para a qual trabalha tem interesse em colaboradores externos e que o meu texto sobre Madrid despertara a curiosidade das chefias, que estavam dispostas a comprar-me serviços. Para ser sincero, nem fazia ideia se o meu contrato com o Periódico permitia esse tipo de relação profissional. Mas garanti-lhe que tal me estava vedado por um rigoroso acordo de exclusividade. Pedi-lhe, todavia, que tentasse manter a porta entreaberta para o futuro, assegurei-lhe, mesmo sendo falso, que a ideia de escrever para uma revista de viagens me seduzia. Despedimo-nos com promessas de ficarmos em contacto e, hipocritamente, desejei-lhe sucesso na tarefa de procriar. Anos antes, sentir-me-ia atraído pela ideia de exercitá-la para a concepção, mas, defronte do aburguesamento precoce daquela figura, em tempos bela, porque arisca e simpaticamente selvagem, os sentimentos eram outros. Não seriam de repulsa, mas de desilusão eram certamente (...).
terça-feira, 12 de março de 2013
Manhã de domingo em Madrid - excerto do capítulo 5
(...) Apesar de nada conhecer para lá de Santiago de Compostela, dei-me conta de que as decisões iam sendo tomadas apenas por exclusão de partes. Não me apetecia passar uma semana enfiado num barco. Excluí os cruzeiros. Achava idiota ir de avião para a praia. Coloquei de parte todos os chamados paraísos tropicais. Estávamos em Janeiro e o Inverno não dava tréguas. Adiei para outras núpcias uma visita a Amesterdão e afastei qualquer intenção de ir além dos Pirenéus. Deixei emergir o lado forreta da minha personalidade, comprei uma viagem numa companhia de aviação de baixo custo e fiz as malas para a capital espanhola.
Aterrei em Madrid numa fria mas ensolarada manhã de domingo. Viajei sozinho. Pretendia palmilhar a cidade, passar pelos pontos de visita obrigatória e, sobretudo, observar o modo de vida dos madrilenos. O Retiro foi a primeira paragem, ainda a arrastar a mala. Entretive-me durante algum tempo a ver o movimento e dei comigo a concluir que os visitantes do parque eram domingueiros profissionais. Haviam acordado cedo, supostamente para se divertirem. Mas fazer o despertador madrugar num domingo de Inverno não será cumprir uma obrigação? Poderá o ócio estar tão corrompido na nossa sociedade que tenha horas marcadas? Provavelmente sim, foi a minha conclusão. Os jovens adultos, equipados com roupa desportiva das melhores marcas, que passaram por mim em ofegantes correrias, mirando com método os apetrechos electrónicos de controlo das pulsações, faziam-me lembrar executivos bem postos. Corriam, pedalavam ou patinavam, mas eu imaginava-os ensanduichados dentro de fatos e gravatas de bom corte e melhor tecido, pasta na mão, acelerando para um relógio de ponto. Aproximei-me do lago, admirei o Monumento a Afonso XII e inflecti em direcção ao Palácio de Cristal. O arvoredo, a relva e a passarada fizeram-me relaxar.
Os stressados do desporto dominical já haviam ficado para trás. Achei o sossego. Não me sentei na relva porque esta estava ainda húmida da geada nocturna. Ao longe, junto de uma estátua equestre, vi uma série de pessoas dispostas em semicírculo. Foquei-me naquele quadro e percebi que se tratava de uma leitura colectiva. Todos, e seriam mais de uma dúzia, estavam sentados no chão com um livro aberto em frente. Ao centro, uma rapariga, com pouco mais de 20 anos, lia em voz alta um texto da obra que, pressupus, fosse a mesma que os companheiros mantinham diante dos olhos. Não me aproximei demasiado, porque não quis perturbar o clima de pura harmonia que ali descobri. Por isso, não escutei as palavras pausadas da leitora. Ignoro o seu teor, mas gostei tanto daquele instante de sossegada distensão que decidi convencer-me de que leriam um belo romance ou palavras subversivas contra a ditadura dos mercados e do pensamento único da austeridade que ameaçava já toda a Europa (...)
segunda-feira, 11 de março de 2013
Capítulo 3 - Excerto
(...) No começo do segundo semestre, mas ainda antes de as notas serem publicadas, encontrei-a à porta do bar da faculdade. A professora segurava o cigarro com a mão esquerda e a chávena de café com a direita. Levava delicadamente o cigarro aos lábios finos, pintados com um suave tom de castanho, expelindo o fumo com a boca entreaberta, derramando sensualidade. Abeirei-me e perguntei, sorridente e trocista, se a tinha desiludido.
- A frequência correu-lhe bem. Mas gostava de o pôr à prova noutras matérias, disparou Cristina com indisfarçável impudência. Lembro-me como se fosse hoje. Engoli em seco. Tentei retorquir qualquer coisa de espirituoso, mas as palavras atropelaram-se e não logrei senão imitir um emaranhado de sons, mais parecido com um guincho do que com uma frase.
- Amanhã à tarde tem que fazer?
- As aulas acabam à uma e meia. Depois disso estou livre.
- Era bom que trocássemos umas ideias sobre o assunto, concluiu Cristina, piscando-me o olho direito.
Na tarde seguinte, telefonou-me. Combinámos encontrar-nos na praça da alimentação de um centro comercial. Com a mania da pontualidade que ainda hoje me consome, fui o primeiro a chegar. Sentei-me na área dos fumadores, como estipulado, e bebi um café. Cristina fez-se esperar. Ligou-me dez minutos depois da hora apalavrada. Pediu-me que fosse ter com ela ao parque de estacionamento do piso menos 2, à secção 29D azul, onde me esperava num potente carro desportivo, presente do marido. Quando entrei logo inalei o odor adocicado de um perfume com notórios efeitos afrodisíacos.
Foi neste dia que entrei pela primeira vez num motel. Cristina era claramente senhora da situação. Recusou a suíte dezoito, perguntando se a vinte e três estaria disponível. Explicou-me que a dezoito era mal situada e deficientemente insonorizada. Por baixo da janela localizava-se o ponto de encontro das funcionárias do motel e o ruído dos circunlóquios destas irrompia pelo quarto.
Voltámos ali frequentemente. Era Cristina quem pagava os quarenta euros que permitiam a ocupação do espaço durante doze horas. Nunca gozámos de uma permanência tão longa, porque ela devia estar em casa pela hora do jantar, quando o esposo e financiador chegasse. Mas antes de cada regresso ao lar, tínhamos tempo de realizar as fantasias mais recônditas. Ambos sabíamos que o principal picante da relação era a transgressão. Eu possuía a professora, mulher adulta, numa espécie de realização edipiana serôdia. Ela, amadurecida em corpo jovial, com uma vida sexual monótona entre as paredes do matrimónio, sentia-se desejada por um jovem pujante, incansável e insaciável. A relação era completamente descomprometida. Não havia dia fixo para os encontros, que tanto podiam prolongar-se das duas às sete da tarde como terem de resolver-se numa fugidia passagem de uma hora pelo quarto de cama redonda e tecto espelhado. Só existia um compromisso entre nós. (...)
- A frequência correu-lhe bem. Mas gostava de o pôr à prova noutras matérias, disparou Cristina com indisfarçável impudência. Lembro-me como se fosse hoje. Engoli em seco. Tentei retorquir qualquer coisa de espirituoso, mas as palavras atropelaram-se e não logrei senão imitir um emaranhado de sons, mais parecido com um guincho do que com uma frase.
- Amanhã à tarde tem que fazer?
- As aulas acabam à uma e meia. Depois disso estou livre.
- Era bom que trocássemos umas ideias sobre o assunto, concluiu Cristina, piscando-me o olho direito.
Na tarde seguinte, telefonou-me. Combinámos encontrar-nos na praça da alimentação de um centro comercial. Com a mania da pontualidade que ainda hoje me consome, fui o primeiro a chegar. Sentei-me na área dos fumadores, como estipulado, e bebi um café. Cristina fez-se esperar. Ligou-me dez minutos depois da hora apalavrada. Pediu-me que fosse ter com ela ao parque de estacionamento do piso menos 2, à secção 29D azul, onde me esperava num potente carro desportivo, presente do marido. Quando entrei logo inalei o odor adocicado de um perfume com notórios efeitos afrodisíacos.
Foi neste dia que entrei pela primeira vez num motel. Cristina era claramente senhora da situação. Recusou a suíte dezoito, perguntando se a vinte e três estaria disponível. Explicou-me que a dezoito era mal situada e deficientemente insonorizada. Por baixo da janela localizava-se o ponto de encontro das funcionárias do motel e o ruído dos circunlóquios destas irrompia pelo quarto.
Voltámos ali frequentemente. Era Cristina quem pagava os quarenta euros que permitiam a ocupação do espaço durante doze horas. Nunca gozámos de uma permanência tão longa, porque ela devia estar em casa pela hora do jantar, quando o esposo e financiador chegasse. Mas antes de cada regresso ao lar, tínhamos tempo de realizar as fantasias mais recônditas. Ambos sabíamos que o principal picante da relação era a transgressão. Eu possuía a professora, mulher adulta, numa espécie de realização edipiana serôdia. Ela, amadurecida em corpo jovial, com uma vida sexual monótona entre as paredes do matrimónio, sentia-se desejada por um jovem pujante, incansável e insaciável. A relação era completamente descomprometida. Não havia dia fixo para os encontros, que tanto podiam prolongar-se das duas às sete da tarde como terem de resolver-se numa fugidia passagem de uma hora pelo quarto de cama redonda e tecto espelhado. Só existia um compromisso entre nós. (...)
domingo, 10 de março de 2013
Comunicado de Imprensa - Um Romântico em Trânsito pela Terra dos Cínicos disponível em e-book
Um Romântico em Trânsito pela Terra dos Cínicos, obra de estreia de José Carlos Gomes, está disponível em formato de livro electrónico, desde o dia 8 de Março.
O e-book pode ser encontrado na livraria online da Leya e na Amazon, devendo chegar, nos próximos dias, a outras plataformas de venda de livros electrónicos, como a Apple Store, Barnes & Noble, Fnac.pt, Gato Sabido, IBA, Kobo, Livraria Cultura, Submarino e Wook.
Sobre o Livro
Com a actual crise financeira como pano de fundo, Alberto Pedro, um jovem jornalista, experimenta na primeira pessoa os efeitos da precariedade laboral na vida profissional e a volatilidade que, inevitavelmente, acaba por atingi-lo no plano mais íntimo. Entre o idealismo que o move e o cinismo que encontra em redor, o protagonista trilha um caminho de dura descoberta interior.
Narrado pela “voz” da personagem principal, Um Romântico em Trânsito pela Terra dos Cínicos passa-se na cidade do Porto e está escrito num registo directo, por vezes rude, do qual transparece o estado de espírito atormentado do narrador.
“Apesar de ser um texto de ficção, cada capítulo pode ser lido como uma espécie de crónica da vida quotidiana. As personagens não são baseadas em qualquer personalidade real, mas as situações são perfeitamente plausíveis. A geração dos 500 ou dos mil euros pode rever-se em Alberto Pedro, um jovem saído da universidade que almeja o sucesso profissional, mas que encontra um meio em que a corrupção, a especulação financeira e imobiliária, poucas ou nenhumas oportunidades dão às novas gerações”, explica o autor.
Sobre o Autor
José Carlos Gomes nasceu em 1978, no Porto, vivendo desde então em Ermesinde, um desinteressante dormitório dos arredores da Invicta. Durante cerca de uma década fez do jornalismo a sua principal actividade profissional, tendo fundado o projecto electrónico Valongo Digital e a publicação especializada Jornal Ciclismo. Passou pel' O Comércio do Porto, pelo Jornal de Notícias e pel'O Primeiro de Janeiro. Actualmente, a sua principal ocupação profissional fá-lo passar grande parte da semana em Lisboa, onde trabalha, desde 2011, como assessor da Federação Portuguesa de Ciclismo. Acumula esta função com a tarefa, que executa desde 2007, de escrever a página de bares e discotecas da edição Norte da revista Visão.
Ficha Técnica
Título: Um Romântico em Trânsito pela Terra dos Cínicos
Autor: José Carlos Gomes
Edição: Edição de Autor
ISBN: 9789899830400
Páginas: 95
Preço: €4,99
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O e-book pode ser encontrado na livraria online da Leya e na Amazon, devendo chegar, nos próximos dias, a outras plataformas de venda de livros electrónicos, como a Apple Store, Barnes & Noble, Fnac.pt, Gato Sabido, IBA, Kobo, Livraria Cultura, Submarino e Wook.
Sobre o Livro
Com a actual crise financeira como pano de fundo, Alberto Pedro, um jovem jornalista, experimenta na primeira pessoa os efeitos da precariedade laboral na vida profissional e a volatilidade que, inevitavelmente, acaba por atingi-lo no plano mais íntimo. Entre o idealismo que o move e o cinismo que encontra em redor, o protagonista trilha um caminho de dura descoberta interior.
Narrado pela “voz” da personagem principal, Um Romântico em Trânsito pela Terra dos Cínicos passa-se na cidade do Porto e está escrito num registo directo, por vezes rude, do qual transparece o estado de espírito atormentado do narrador.
“Apesar de ser um texto de ficção, cada capítulo pode ser lido como uma espécie de crónica da vida quotidiana. As personagens não são baseadas em qualquer personalidade real, mas as situações são perfeitamente plausíveis. A geração dos 500 ou dos mil euros pode rever-se em Alberto Pedro, um jovem saído da universidade que almeja o sucesso profissional, mas que encontra um meio em que a corrupção, a especulação financeira e imobiliária, poucas ou nenhumas oportunidades dão às novas gerações”, explica o autor.
Sobre o Autor
José Carlos Gomes nasceu em 1978, no Porto, vivendo desde então em Ermesinde, um desinteressante dormitório dos arredores da Invicta. Durante cerca de uma década fez do jornalismo a sua principal actividade profissional, tendo fundado o projecto electrónico Valongo Digital e a publicação especializada Jornal Ciclismo. Passou pel' O Comércio do Porto, pelo Jornal de Notícias e pel'O Primeiro de Janeiro. Actualmente, a sua principal ocupação profissional fá-lo passar grande parte da semana em Lisboa, onde trabalha, desde 2011, como assessor da Federação Portuguesa de Ciclismo. Acumula esta função com a tarefa, que executa desde 2007, de escrever a página de bares e discotecas da edição Norte da revista Visão.
Ficha Técnica
Título: Um Romântico em Trânsito pela Terra dos Cínicos
Autor: José Carlos Gomes
Edição: Edição de Autor
ISBN: 9789899830400
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sexta-feira, 8 de março de 2013
Um Romântico em Trânsito pela Terra dos Cínicos
Capítulo 1
Ali estava eu, Alberto Pedro, gravador digital pousado na mesa redonda de tampo branco, ar sério e compenetrado, pensamento vagueante e distraído. Em frente, a cabeleireira Maria Emília Lemos, nervosa e intimidada, embora vaidosa por ser entrevistada. Fora contactada por um vendedor de publicidade que se anunciou como gestor de conteúdos e que lhe prometeu uma entrevista a ser publicada num suplemento do jornal Regional, diário outrora de referência, mas entretanto em agonia acelerada. Disse-lhe, por telefone, que seria uma edição dedicada a empreendedores de sucesso. Por isso, queriam entrevistá-la, já que abrira um salão de beleza numa altura de crise, motivo mais do que suficiente para merecer honras de mediatismo. Para ver as suas palavras e as fotografias dadas à estampa deveria, apenas, custear uma pequena inserção publicitária. Bem via, com as dificuldades que a Internet colocava à imprensa, só deste modo as publicações em papel poderiam sobreviver. Feitas as contas, Maria Emília Lemos entendeu que a exposição que conseguiria valia bem os dois mil euros que lhe pediam pelo anúncio. Assinado o contrato, o assunto transitou do departamento comercial para a secção redactorial. A tarefa foi-me entregue. Tratei de contactar a cabeleireira e de agendar a entrevista. A senhora queria comparecer na redacção, local insalubre, sem condições para receber visitas. Habilidosamente, convenci-a a esperar-me no salão de beleza de que é proprietária. Nada melhor do que ser fotografada no seu espaço, certamente bem decorado e confortável. Com esta argumentação, insuflei-lhe o ego e evitou-se o embaraço. Ficou a entrevista agendada para dali a dois dias, manhã cedo, num horário de pouco movimento no salão.
Na data e à hora apalavradas, compareci n’ O Nome da Rosa, assim se designava o estabelecimento. Encontrei Maria Emília muito solícita, feliz pela honra de ser requisitada pelo sistema mediático, e produzida para o grande acontecimento. Nem vestígios da bata de trabalho. Trajava um provocante vestido colorido que lhe realçava as formas voluptuosas e destacava os seios fartos através do decote em V, o que muito me entreteve durante o serviço. Os lábios carnudos, pintados de vermelho-escarlate, as faces brilhantes, devido ao abuso de creme de rosto, as pestanas com as pontas reviradas e a sombra nas pálpebras também denunciavam o cuidado com que a cabeleireira se preparara. Já eu vesti-me como habitualmente. Camisola de manga curta com um estampado negro, calças de ganga e umas Sanjo pretas nos pés. Transportei comigo uma mochila onde guardava o gravador digital, o bloco de apontamentos, duas esferográficas, porque os jornalistas não podem correr o risco de ficar sem tinta a meio do trabalho, e a máquina fotográfica, porque se viviam tempos em que se desvalorizam os fotógrafos e em que as imagens ficavam por conta de quem escreve.
Estas entrevistas, a que chamam publi-reportagens, seguem um questionário preciso. Quem for destacado para a tarefa não precisa de ter dotes de conversador ou de entrevistador. Basta ser capaz de obedecer ao guião para retirar as informações necessárias à construção de um texto, que deverá ser o mais laudatório possível para o interlocutor, que, afinal, paga para merecer a alegria de ser elogiado na imprensa. O modus operandi ajuda os jovens inaptos e sem talento que as faculdades despejam no mercado em quantidades dignas do sector grossista. Para alguém com experiência no jornalismo e com aptidão para o ofício aquelas regras podem ser castradoras. Apesar de me ter em boa conta, ou por isso mesmo, nunca me incomodei com tais limitações. Aliás, é sempre possível trocar a ordem às questões, fazendo a conversa desenrolar-se com naturalidade. Já me calhou, naquelas funções, entrevistar um antigo ministro e presidente de um banco. Nessa circunstância e porque tenho fobia a passar por lorpa, não arranquei com a pergunta inicial do roteiro, que, no caso, seria “quando foi inaugurado o banco?”. Mesmo as publi-reportagens têm um limite de indigência intelectual e eu não gostava de colocar-me a jeito para ouvir remoques do género: “Sabe o que é a Internet? Olhe que essa informação está lá nossa página oficial”. Mas perante Maria Emília, apesar de o decote dela me sugerir outros questionamentos, soltei a interrogação da ordem:
- Quando abriu este salão?
- No início do Verão, na altura em que as senhoras ficam mais vaidosas e gostam de mostrar a boa forma nas praias, respondeu, pontuando a frase com risinhos nervosos.
- Como surgiu a ideia de designar a empresa por O Nome da Rosa?, interessei-me.
- Isso nasceu do meu gosto pela leitura. O Nome da Rosa, por acaso, nunca li. Mas tenho-o lá em casa. Foi uma vez oferecido na compra de um jornal qualquer. Como o meu salão se destina a mulheres e a rosa é uma das flores preferidas das senhoras, resolvi escolher este nome, explicou, antes de concluir, tentando ser engraçada:
- Só espero não ser acusada de plágio pelo autor, o Alberto Deco.
Ainda hoje não deve ter percebido o motivo por que me descontrolei de riso.
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